quinta-feira, 30 de junho de 2016

A T L E T A

         "A recordação mais antiga que tenho de ler sobre os Jogos é de uma noite na primavera de 1967, quando estava no primeiro ano do ensino médio, e murmurei algumas palavras para meus pais durante o jantar, referindo-me a entrar para a equipe de atletismo.
'Humm', resmungou meu pai, e continuou comendo seu bife. 'Isso é bom', disse finalmente. 'Talvez lhe dê um pouco de disciplina.' Arqueou as sobrancelhas e perguntou: 'você conhece a origem da palavra atleta?'
         Revirei os olhos, procurando a cumplicidade de meu irmãozinho Paul e reconhecendo o prelúdio habitual de nosso pai a uma aula sobre o espírito dos gregos antigos. Mas, dessa vez, ele me surpreendeu pedindo-me para segui-lo escada abaixo , até o porão, onde me sentou numa cadeira ao lado da mesa de pingue-pongue. Alguns minutos depois, jogou um dicionário e alguns números antigos da Nathional Geographic em cima da mesa e começou a folheá-los.
         'Ah, eu sabia que estava por aqui', disse ele quando encontrou o número de outubro de 1964. Foi virando as páginas, zombando das imagens extremamente romantizadas dos antigos Jogos de Olímpia e lembrando-me das maravilhosas pinturas em cerâmica que ele tinha me mostrado  no Metropolitan Art Museum de Nova York anos antes. Ainda me lembro do retrato de Filipides, o primeiro e lendário 'maratonista', que caiu morto de exaustão ao chegar a Atenas, depois de pronunciar sua última palavra: Nenikikamen! (Vencemos!). Finalmente encontrou o que procurava.
        'Olha, está aqui', disse ele com orgulho, apontando no dicionário. 'Atleta vem de Athlon, a antiga palavra grega para disputa'. Depois voltou-se para o artigo da revista que falava sobre os Jogos de Tóquio. Sua voz ficou séria, , como se ele mesmo estivesse prestes a entrar numa partida decisiva de um jogo violento de futebol americano. 'Está aí, filho, é nisso aí que você está entrando: um mundo onde o homem é o lobo do homem, onde tudo é disputa. Mas, se aprender a competir, vai ser bom para você. É por isso que o esporte é importante: ensina você a enfrentar a adversidade, a superar-se, a acreditar em si mesmo.'
        Aquele momento fulgura em minha memória. Lembro-me do anseio na voz de meu pai de que eu entendesse que há uma história grandiosa e nobre por trás de praticamente tudo quanto fazemos. é por isso que líamos os clássicos em família e é por isso que ele passou muitas noites de inverno no porão criando livros de recortes para todos nós, enchendo-os de trechos de artigos de viagem e de revistas de arte, junto com fotografias de trens, aviões e navios, astros e estrelas de cinema, inventores e heróis do esporte.
Estou convencido de que meu pai estava tentando, à sua moda, passar para mim a tocha da inspiração"
Do livro "O Ideal Olímpico e o Herói de Cada Dia"
Phil Cousineau
Editora Mercuryo Ltda. 

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